A prevenção da deterioração do meio ambiente tornou-se uma questão de sobrevivência para o ser humano no planeta terra.
Diante desse quadro surge à necessidade de novas regras que tipificassem os crimes contra o meio ambiente, e para tanto foram criadas normas capazes de suprir a demanda que se tinha na legislação existente até então.
Nas décadas de 1970 e 1980, emergiram grandes movimentos em prol da questão ambiental e dos direitos humanos, quando ocorreu um intenso processo de conscientização mundial, motivando a participação de nações identificadas por suas causas em comum a promoverem uma grande reunião em Estocolmo, em 1972. Nessa memorável iniciativa mundial, foram firmados vários princípios do Direito Ambiental, provocando o surgimento de leis internas aos países participantes do conclave.
Esse movimento se multiplicou mundialmente, revelando a necessidade de novas regras de proteção aos recursos ambientais e a tipificação dos crimes contra o meio ambiente, ou seja, eram necessárias normas capazes de suprir aquela demanda. Surgiu, então, um novo ramo do Direito brasileiro – o Direito Ambiental.
Para se definir o novo Direito, torna-se necessário o esclarecimento acerca de Direito Ambiental e, nesse sentido, a conceituação de Milaré (2004, p. 155) se faz importante: “[...] o complexo de princípios e normas coercitivas reguladores das atividades humanas que, direta ou indiretamente, possam afetar a sanidade do ambiente em sua dimensão global, visando à sua sustentabilidade para as presentes e futuras gerações”.
Do conceito de Milaré pode-se compreender que, em matéria de Direito Ambiental, se lida sempre com rol amplo de normas regulamentadoras das atividades do homem, que determinam a forma de usar o meio ambiente, estabelecendo padrões de sustentabilidade, para que os presentes usuários não comprometam o direito das futuras gerações.
O marco inicial do Direito Ambiental, no Brasil, se dá com a Lei Federal nº 6.938/81 – Lei da Política Nacional do Meio Ambiente que se tornou o paradigma de proteção ambiental no País, objetivando a preservação da qualidade ambiental propícia à vida e contemplando instrumentos, princípios e diretrizes que visam à sustentabilidade. A referida Lei traz conceitos importantes, dentre os quais, a de meio ambiente, a saber:
Art. 3° Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I - meio ambiente: o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.
A Lei nº 6.938/81 trouxe, portanto, o conceito legal de meio ambiente, até então não contemplado na legislação brasileira.
Outras definições estão incluídas na referida Lei, pois, no mesmo artigo, inciso II, explicita que dano ambiental é toda a “[...] degradação da qualidade ambiental: a alteração adversa das características do meio ambiente”.
Desse modo, ao utilizar a expressão “degradação ambiental”, o legislador assim o fez, levando em consideração o sentido amplo do meio ambiente, tendo em vista que este é composto por todos os recursos naturais, bem como o próprio homem.
Ressalta-se, ainda, a conceituação de Mirra (2002, p. 89) no que tange a dano ambiental:
O dano ambiental pode ser definido como toda degradação do meio ambiente, incluindo os aspectos naturais, culturais e artificiais que permitem e condicionam a vida, visto como bem unitário imaterial coletivo e indivisível, e dos bens ambientais e seus elementos corpóreos e incorpóreos específicos que o compõem, caracterizadora da violação do direito difuso e fundamental de todos à sadia qualidade de vida em um ambiente são e ecologicamente equilibrado.
Do conceito de Mirra (2002), é possível entender-se que, em matéria ambiental, há de se considerar a totalidade de bens que a compõe, a fim de se identificar a existência de dano ambiental.
Da conceituação trazida, verifica-se a amplitude do tema meio ambiente, pois, quando se está diante de um dano ambiental, se está sempre diante de dificuldades no que se refere à sua identificação e à sua posterior classificação para fins de indenização.
Aliás, quando o assunto for agressão ao meio ambiente, este sempre é tratado como solo, ar, água; no entanto, o tema é muito mais amplo do que apenas os recursos ambientais compreendidos de forma isolada. Requer uma visão holística desse meio, do qual o homem faz parte, e cuja interferência causada no meio ambiente, influenciará diretamente na vida do homem.
Quando se fala em dano ambiental, o bem agredido é o meio ambiente na sua forma universal, ecossistema onde os recursos naturais, como solo, recursos hídricos, ar, toda a biodiversidade estão harmoniosamente interligados e do qual o homem faz parte.
Sempre que houver a ocorrência de um dano ambiental, a coletividade, ou seja, um número indefinido de pessoas detentoras do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado está sendo atingido.
O dano ambiental terá sempre repercussões no plano coletivo e individual. Quando ele atingir a coletividade, está sendo feita referência a um direito difuso. Isso significa que está atingindo a vários sujeitos detentores de um mesmo direito e, no plano individual, os prejuízos afetarão a propriedade ou a saúde de um particular.
A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, no Artigo 3º, inciso IV, trouxe o conceito de poluidor: “[...] entende-se por poluidor a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental” (Lei Federal nº 6.938, 1981). Por tal motivo, aquele que tiver sua conduta conforme a previsão do artigo acima será responsabilizado, independentemente de existência de culpa, bastando o evento danoso e o nexo causal, ou seja, aquele que, no desempenho de sua atividade, causar algum dano ao meio ambiente deverá repará-lo, não se questionando a culpa do infrator, pois a reparação está atrelada ao fato de ser sua atividade potencialmente poluidora. Assim, por ser a atividade considerada lesiva ao meio ambiente, deverão ser adotadas medidas de prevenção e precaução para que a degradação ambiental não venha a se concretizar.
Nessa direção, com a promulgação da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente/81, passou o ordenamento jurídico brasileiro a dispor de uma Lei de suma importância ao meio ambiente.
No entanto, o diploma que conferiu o status maior ao meio ambiente, no País, foi a Constituição Federal de 1988, que traz em seu conteúdo um capítulo específico sobre meio ambiente. Isso decorreu em razão de novas expectativas da população que ganharam relevo, cujos contornos se mostraram contrários às fórmulas clássicas de tratar do tema. De acordo com tal linha de análise, Canotilho e Leite (2010, pp. 78-79) consideram que
[...] a ecologização do texto constitucional traz certo sabor herético, deslocando das fórmulas antecedentes, ao propor a receita solidarista – temporal e materialmente ampliada (e, por isso mesmo, prisioneira de traços utópicos) – do nós-todos-em-favor-do-planeta. Nessa, comparando-a com os paradigmas anteriores, nota-se que o eu individualista é substituído pelo nós coletivista.
Assim, o Artigo 225 da Constituição Federal apresenta um direito constitucional no qual os destinatários são todos os seres humanos.
Nesse sentido, faz referência Padilha (2010, p.114 -115);
A constitucionalização da proteção ambiental pela Constituição de 1988, por meio de todo um capítulo dedicado ao meio ambiente, significou um salto de qualidade na normatividade ambiental brasileira e colocou as bases fundamentais do Direito Constitucional Ambiental por uma opção de “ecologizaçao” do texto constitucional, adotando um novo paradigma jusambiental.
A Constituição Brasileira de 1988 instituiu o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como um direito fundamental e determinou que a defesa e preservação visassem às presentes e às futuras gerações e, ainda, que essa defesa é um dever do Poder Público e de toda a coletividade.
Nessa consideração, Canotilho e Leite (2010, p. 79) afirmam:
Não há aí simples reordenação cosmética da superfície normativa, constitucional e infraconstitucional. Ao revés, trata-se de operação mais sofisticada, que resulta em tríplice fratura no paradigma vigente: a diluição das posições formais rígidas entre credores e devedores (a todos se atribuem, simultaneamente, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e o dever de protegê-lo); a irrelevância da distinção entre sujeito estatal e sujeito privado, conquanto a degradação ambiental pode ser causada, indistintamente por um ou pelo outro, e até, com frequência, por ambos de maneira direta ou indiretamente concertada; e, finalmente, o enfraquecimento da separação absoluta entre os componentes naturais do entorno (o objeto, na expressão da dogmática privatística) e os sujeitos da relação jurídica.
Quando tratou sobre o meio ambiente, a Constituição trouxe uma nova modalidade de bem, diferenciando-o dos bens públicos e particulares, que é o bem ambiental, assim tratado pela doutrina. É um bem de valor difuso, imaterial ou material, serve de objeto mediato às relações jurídicas de natureza ambiental.
Quanto à natureza jurídica do bem ambiental ou dos bens ambientais, como prefere dizer a doutrina brasileira dominante, não há divergências: trata-se de bem difuso, protegido por um direito que assegura um interesse transindividual, de natureza indivisível, onde seus titulares são pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato, conforme pode se resumir do Artigo 81, I, (Código de Defesa do Consumidor, 1990).
Há, pois, um reconhecimento geral no sentido de que o meio ambiente ecologicamente equilibrado se constitui em um bem de uso comum do povo. Nesse sentido, o disposto no Artigo 225 da Constituição Federal não deixa dúvidas, pois, se for de uso comum, não há titularidade plena, todos têm o direito de uso, e, portanto, jamais poderá ser apropriado pelo particular para fins de consumo privado.
Assim, o Direito Ambiental tem seu conteúdo normativo reafirmado na Constituição Federal de 1988, Capítulo VI, caput do artigo 225:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para a presente e futuras gerações.
Desde então, conforme afirma Brandalise (2008, p. 1),
[...] a legislação ambiental brasileira é considerada uma das mais completas do mundo. O regramento jurídico é constituído por um conjunto de leis que definem as obrigações, responsabilidades e atribuições dos cidadãos, empreendedores ou não, e do Poder Público e está fundamentado em princípios.
Os princípios, considerados como fontes normativas, que fundamentam a legislação ambiental são, ainda de acordo com Brandalise (2008, pp. 1-3):
- princípio da prudência ou da cautela: interferência no meio ambiente deve ser precedida de estudos que previnam a ocorrência de danos;
- princípio do equilíbrio: adequação entre as vantagens econômicas e sociais quanto à intervenção no meio ambiente, prevendo impactos de médio e longo prazo;
- princípio do limite: estabelecido pela administração pública o padrão de proteção ambiental que impeça a degradação do meio ambiente;
- princípio da responsabilidade ou do poluidor-pagador: objetiva impedir que a sociedade arque com despesas e prejuízos de ato lesivo ao meio ambiente, além de obrigar o poluidor a restabelecer o ambiente e indenizar os danos causados a terceiros.
Especificamente, Brandalise (2008, p. 3) considera os princípios que norteiam o Direito Ambiental. Primeiramente, indica o princípio que conclama um direito fundamental do ser humano: “O ambiente sadio é um direito de todo ser humano”. A seguir, aponta para a convivência entre as espécies, afirmando que “[...] a diversidade biológica é condição da harmonia entre o homem e a natureza, sendo que a extinção das espécies deve ser evitada”. Em seqüência, apresenta princípios relativos à responsabilidade de quem causa danos ao ambiente:
[...] o acesso aos recursos naturais deve ser equitativo e razoável; quem usa os recursos naturais deve pagar e quem polui também deve pagar e reparar; o perigo de dano significativo ao meio ambiente, ainda que não reconhecido com absoluta certeza, obriga a atitudes imediatas de proteção; o dano ao meio ambiente deve ser prevenido e evitado; o dano ao meio ambiente deve ser reparado, se possível, integralmente; as atividades concernentes ao meio ambiente devem ser informadas de forma transparente, eficaz e tempestiva (BRANDALISE, 2008, 4).
Por fim, faz referência aos agentes que devem assumir o compromisso com a proteção ambiental:
[...] as pessoas e as organizações não governamentais têm direito de participar do processo nas decisões públicas ambientais e têm direito de acesso ao poder judiciário para a defesa dos interesses difusos; o poder público é responsável pelas ações e decisões que prejudiquem ou possam prejudicar o meio ambiente (idem).
A Constituição de 1988, quando cuida da responsabilização por infração, dano ou crime ambiental, em seu Artigo 225, § 3º, traz que: “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.
Assim, por ser uma atividade lesiva ao meio ambiente, deverão ser adotadas medidas de prevenção e precaução para que a degradação ambiental não venha a se concretizar.
No que se refere à responsabilização por dano ambiental, a Lei Federal 6.938/81, traz em seu Artigo 14, § 1º que:
§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente.
A responsabilidade por dano causado na seara ambiental leva em consideração a atividade do causador do dano ambiental, ou seja, a potencialidade daquela em causar um dano ao meio ambiente. Tanto é assim, que o mesmo diploma legal, em seu Artigo 10, registra:
Art. 10, caput: A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis.
Do significado de atividade potencialmente poluidora, pode-se extrair o risco que existe na atividade em causar um dano ambiental.
Para assegurar o status quo ante, a Constituição Federal de 1988, no seu Artigo 225, §1º, IV, disciplinou o instrumento conhecido como Estudo do Impacto Ambiental, o qual tem, entre uma de suas finalidades, a recomposição do meio ambiente modificado por ocasião do dano ambiental. Assim sendo, mediante esse importante instrumento, é possível fazer-se a avaliação dos danos causados.
Nesse sentido, a Constituição de 1988, Artigo 225, § 1º, IV, define que:
Art. 225, § 1º, IV: Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público: IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.
Outro diploma legal, de suma importância na responsabilização do infrator do dano ambiental, é a Lei dos Crimes Ambientais que prevê as sanções penais e administrativas para condutas que forem lesivas ao meio ambiente. Em seu Artigo 3º, traz as formas de responsabilização na área ambiental, como segue:
Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.
Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato.