Unidade A - Introdução à Química Orgânica

Introdução

Histórico

Você sabia que a Química Orgânica existia desde os tempos pré-históricos? É verdade, muitos anos antes de Cristo já se conheciam vários processos de Química Orgânica, tais como:

- Obtenção do vinho por fermentação do suco de uva e de outros líquidos açucarados.
- Produção do vinagre (ácido acético -H2CO2-) por fermentação do vinho.

Bom, na época dos egípcios e da civilização romana, já se fazia fazerem extração do anil e da alizarina das respectivas plantas e, mesmo assim, foram descobertos métodos apropriados de fixação dos mesmos nos tecidos. Isso não é interessante?  

Por exemplo, a púrpura de Tiro era uma tinta de cor vermelho-escura e foi utilizada pelos Fenícios, durante muitos séculos. O mais importante de tudo isso é que esses foram praticamente os únicos corantes usados para tingir os tecidos.

Você poderia se questionar, mas quando é que a Química como ciência começou?  Pois bem, ela só se iniciou nos fins do século XVIII e início do século XIX com os estudos das leis das combinações químicas, com base nas quais foi criada a Teoria Atômico-Molecular de Dalton-Avogadro. Essa Teoria você estudou em Química Geral, lembra?

Pois é, até que essa teoria fosse ser criada, a química se resumia na descrição dos processos experimentais observados, mas para isso não existia nenhuma interpretação científica?  Aí, você deve pensar que tudo isso era puramente filosófico... Pois bem, somente depois dessa teoria é que se originaram as fórmulas moleculares dos compostos e, com essas, os processos químicos puderam ser equacionados e cientificamente interpretados.

 Ao mesmo tempo em que eram iniciados os estudos sobre as leis das combinações químicas, o químico sueco Scheele introduzia métodos apropriados de extração de compostos orgânicos dos produtos vegetais e animais. Até essa época eram conhecidos muitos produtos de origem vegetal e animal, por pouco eram os compostos orgânicos obtidos sob forma de espécies químicas definidas.

Contudo, as experiências de Scheele foram além e, entre 1769 e 1785, Carl Wilhelm Scheele (1742-1786) fez uma série de extrações de compostos orgânicos de produtos de origem vegetal e animal, como a extração do ácido cítrico (C6H8O7) do suco de limão; do ácido lático (C3H6O3) do leite azedo; ácido tartárico (C4H6O6) do suco de uva; do glicerol (C3H8O3) de gorduras; do ácido úrico (C5H4N4O3) dos cálculos renais, etc..


http://www.8c1arteband2010.blogspot.com/2010/05/carl-wilhelm-scheele.html

À medida que começou a aumentar o número de compostos extraídos dos organismos vivos (animais e vegetais) os químicos notaram diferenças acentuadas entre as propriedades dos mesmos e as propriedades dos compostos minerais. E sabe o que eles observaram? Que os compostos extraídos dos organismos vivos apresentavam geralmente pontos de fusão e de ebulição incomparavelmente menores que a maioria dos compostos minerais, tais como sal gema (NaCl), salitre do Chile (NaNO3), mármore (CaCO3), etc..

Entretanto, em 1777, o químico sueco Torbern Olof Bergman (1735-1784), no estudo sistemático dos compostos químicos, pela primeira vez, separou-os em duas grandes classes. Sabe quais são elas?   Ele as dividiu em classe dos compostos orgânicos e dos compostos inorgânicos.

Qual seria a diferença entre eles? Bom, na visão de Bergman, os compostos orgânicos eram extraídos dos organismos vivos e os compostos inorgânicos - compostos extraídos dos minerais.

Porém, em 1808, Jöns Jakob Berzelius começou a usar em seus corredores científicos a expressão "Química Orgânica" para a parte da química que estuda os compostos orgânicos, isto é, os compostos extraídos dos organismos vivos (animais e vegetais), ainda que algum livro por volta de 1600, já mencionasse tal expressão.

Mas e quanto à natureza química dos compostos extraídos dos organismos vivos?  Nada se sabia na época.

Entre 1772 e 1777, químico francês Antoine Laurent de Lavoisier observou que todos os compostos extraídos dos organismos vivos originavam dióxido de enxofre (SO2) e água (H2O) como produtos da combustão.  Essa observação de Lavoisier lhe permite obter alguma conclusão? O que você acha?

O que Lavoisier quis demonstrar é que os compostos que foram usados como fontes para a obtenção do dióxido de enxofre e água apresentavam em sua composição carbono(C) e hidrogênio(H).


http://www.cdcc.usp.br/quimica/galeria/lavoisier.html

E será que essa História parou por aí? Claro que não! Depois da descoberta de Lavoisier sobre a composição elementar dos compostos extraídos dos organismos vivos, uma nova diferença entre esses compostos e os compostos minerais foi detectada. E qual foi essa diferença, você deve de estar se perguntando?

Fique em estado de êxtase, pois enquanto os compostos minerais eram formados dos mais variados elementos químicos, os compostos orgânicos eram quase que invariavelmente formados de carbono (C), hidrogênio (H), oxigênio (O) e nitrogênio (N). E a esses elementos, foram chamados de elementos organógenos.

Tome nota! C, H, O e N foram denominados de elementos organógenos, pois fazem parte da composição do organismo.
Mas uma fato muito estranho acontecia na época. O que era então?  O pessoal que trabalhava nos laboratórios conseguia produzir os compostos minerais nos mesmos, e quando tentavam produzir compostos orgânicos, não conseguiam obter êxito! Qual seria a explicação para essa causa?

Muito bem, para explicar esse problema, surgiu na época a Teoria da Força Vital defendida por Berzelius, na qual afirmava que nos organismos vivos existia uma "força" especial, totalmente desconhecida, todavia absolutamente necessária para promover a síntese dos compostos orgânicos. Essa força especial foi chamada de "força vital".

A partir do estabelecimento dessa teoria, a diferença fundamental entre compostos orgânico e compostos mineral passou a ser o fato de os compostos orgânicos poderem ser sintetizados exclusivamente pelos organismos vivos, enquanto que os compostos inorgânicos ou minerais podiam ser sintetizados em laboratório.

A Teoria da Força Vital foi aceita sem qualquer contestação pelos químicos da época até o ano de 1828. Mas o que houve após?
O químico sueco Wöhler por aquecimento do composto mineral "cianato de amônio" (NH4OCN), em laboratório, conseguiu obter a ureia [CO(NH2)2], composto tipicamente orgânico e elaborado nos organismos animais e eliminado através da urina.

Essa experiência ficou conhecida como Síntese de Wöhler, exposta abaixo

Mas ela tinha validade? Sim, pois o próprio Wöhler teve de repetir a sua experiência várias vezes para poder acreditar na sua descoberta.
Mas aí, você deve se perguntar? Isso deve ter sido um abalo na época!
Pois sim, a produção da ureia sem a intervenção da força vital causou movimentação no mundo científico. Embora a evidência de Wöhler fosse real, Berzelius e outros proeminentes químicos da época relutaram em aceitar o fato de ser possível a síntese de composto orgânico sem a intervenção da força vital, isto é, fora dos organismos vivos.

O próprio Wöhler, em 1824, já havia obtido o ácido oxálico (H2C2O4) por hidrólise do cianogênio (C2N2), em laboratório. Essa foi realmente a primeira síntese de composto orgânico fora dos organismos vivos, contudo Wöhler não percebeu que havia feito uma transformação de composto mineral em composto orgânico. Por isto, a obtenção do ácido oxálico (C2H4O2) por hidrólise do cianogênio (C2N2) não teve nenhuma importância (H2C2O4) histórica, embora tivesse precedido a síntese da uréia, pois, não teve influência sobre a veracidade da Teoria da Força Vital.

Essa teoria prejudicou o desenvolvimento da química orgânica porque os químicos da época não faziam pesquisas no sentido de sintetizar compostos orgânicos, pois estavam convencidos de que somente os organismos vivos eram capazes de fazê-los.

A divulgação da obtenção da uréia a partir do cianato de amônio abriu novos horizontes para a Química Orgânica, pois, nada melhor para por à prova a Teoria da Força Vital que a síntese de novos compostos orgânicos fora dos organismos vivos. Assim, novos compostos orgânicos foram sendo obtidos em laboratório e, à medida que seu número foi aumentando, a Teoria foi desaparecendo paulatinamente.
Em 1845, Adolphe Wilhelm Hermann Kolbe (1818-1884) realizou a primeira síntese de um composto orgânico (ácido acético) a partir de seus elementos entre os anos de 1856 a 1863 houve a produção de acetileno (C2H2) através de Berthelot.

Em 1858, surgiu na química orgânica a famosa "Teoria das Fórmulas Estruturais", estabelecida pelo químico alemão Friedrich August Kekulé que permitiu a interpretação de muitas reações dos compostos orgânicos e previu novas propriedades e novos processos de obtenção para os compostos já conhecidos.

Somente depois de estabelecida a Teoria de Kekulé, isto é, estabelecidas as fórmulas estruturais é que o fenômeno da isomeria (compostos que apresentam a mesma fórmula moleculares mas diferentes fórmulas estruturais) pôde ser interpretado, pois, os isômeros, diferem entre si pelas suas fórmulas estruturais. Essa teoria permitiu o estabelecimento das fórmulas estruturais planas dos compostos orgânicos, contudo, não das fórmulas estruturais espaciais. Muitos fenômenos orgânicos não podiam ser interpretados através das fórmulas estruturais planas de seus compostos.

Em 1874, surgiu a "Teoria da Configuração Tetraédrica do Átomo de Carbono", estabelecida independentemente pelo químico francês Lê Bel e pelo químico holandês Vant' Hoff. De acordo com essa teoria, o átomo de carbono estaria no centro de um tetraedro regular imaginário e suas quatro unidades de valência estariam dirigidas para os quatros vértices do tetraedro. Estabelecida essa teoria surgiram as fórmulas estruturais espaciais dos compostos orgânicos e novos fatos puderam ser interpretados e previstos.

Destruída a Teoria da Força Vital, não se justificava a denominação Química Orgânica, pois tanto os compostos minerais como os orgânicos podiam ser sintetizados em laboratório. Contudo, por tradição, foi conservada a denominação. Atualmente a Química Orgânica é definida como sendo a parte da química que estuda os compostos do carbono e não a parte da química que estuda os compostos extraídos dos organismos vivos.

A divisão de Química Orgânica e Química Inorgânica não se fundamentam em nenhum princípio básico, pois as leis gerais da Química se aplicam indistintamente a ambas. A divisão é conservada apenas por razões didáticas e a principal causa dessa divisão é o elevado número de compostos orgânicos existentes.

Atualmente, podemos definir Composto orgânico como aquele que apresenta o átomo de carbono em sua estrutura, por exemplo, o propano (C3H8), que está presente no gás de cozinha. Nem todos os compostos do carbono pertencem ao campo da Química Orgânica, embora contenham carbono, são considerados compostos minerais.

Alguns compostos de carbono são estudados tanto na Química Orgânica como na Inorgânica, tais como o carbonato de cálcio (CaCO3) e outros carbonatos, monóxido de carbono (CO), dióxido de carbono ou gás carbônico (CO2), gás cianogênio (C2N2), ácido cianídrico (HCN), ácido ciânico (HCNO), ácido carbônico (H2CO3) e outros. Esses compostos constituem uma verdadeira ponte ligando o campo da Química Orgânica ao campo da Química Inorgânica, eles podem ser chamados de compostos de transição. Mas por que essa denominação? Pois essas substâncias que possuem carbono apresentam propriedades próximas às dos inorgânicos.