Unidade B - Tratamento Terciário

Remoção de nitrogênio e fósforo em sistemas naturais de tratamento

A remoção de nutrientes em sistemas naturais prevê a utilização de lagoas de estabilização, banhados construídos ou wetlands ou aplicação ao solo. A discussão de sistemas de lagoas já foi realizada anteriormente, portanto, a seguir serão apresentados os fundamentos da remoção de N e P em sistemas do tipo Wetlands.

Wetlands é o termo mais utilizado para estes sistemas de tratamento. São sistemas de transição entre sistemas aquáticos e sistemas terrestres, onde o nível d’água comumente está próximo ou na superfície da terra.

Existem dois tipos de sistemas de tratamento de efluentes com utilização de plantas aquáticas:

A tecnologia utilizada nos Wetlands é totalmente diferente dos sistemas que preconizam a utilização dos aguapés (Eichornia spp.), em lagoas de tratamento. A utilização de aguapés nunca alcançou os resultados desejados e a formação de biomassa em excesso sempre foi o ponto negativo deste tratamento.

Os sistemas de tratamento que utilizam macrófitas aquáticas emergentes apresentam um grande potencial para serem utilizados no tratamento de efluentes industriais, domésticos e de atividades agrícolas, visando à remoção de cor, sólidos suspensos, nitrogênio, fósforo, material orgânico, metais, patogênicos entre outros parâmetros.

Existem diversas denominações para esse sistema de tratamento;

Tipos de sistemas

Existem dois grandes sistemas tratamento que utilizam plantas aquáticas emergentes:

  1. Sistemas de Superfície de Água Livre (SAL): o efluente circula somente sobre a superfície do solo, como nos Wetlands naturais. Os sistemas SAL podem ser naturais (com utilização de solo natural), ou construídos, onde, geralmente, é utilizada uma geomembrana ou materiais argilosos para impermeabilização do terreno.
  2. Sistema de Fluxo Sub-superficial (FSS): nesses sistemas, não há formação de lâmina de água, o efluente circula através de uma matriz porosa de areia grossa ou brita, na qual estão presentes as raízes das macrófitas.
  3. No Brasil, a preferência é pelo uso de sistemas de Fluxo Sub-Superficial (FSS), que podem ser divididos em dois tipos:

    Existe ainda o chamado Sistema Combinado ou Híbrido, que consiste na utilização conjunta dos Sistemas de Fluxo Horizontal e de Fluxo Vertical, porém, construídos em células diferentes do mesmo sistema de tratamento.

  4. Sistema de Fluxo Horizontal (SFH): Este sistema é chamado de fluxo horizontal porque o efluente percorre vagarosamente todas as camadas do solo artificial e desloca-se no sentido horizontal, desde a entrada até a saída do sistema. Durante este percurso, o efluente passa por zonas aeróbias, anaeróbias e anóxicas.

    Na rizosfera, ao redor das raízes e dos rizomas das plantas, é formada uma zona aeróbia. Nesta zona, existe uma intensa vida microbiológica, favorecida pela capacidade de transporte do oxigênio atmosférico pelas plantas emergentes, por suas folhas, caules e hastes, até a zona de raízes. É nesta zona que ocorre a oxidação da matéria orgânica pelas bactérias heterotróficas, a oxidação do nitrogênio amoniacal a nitrito e a nitrato pelas bactérias autotróficas e a volatilização da amônia.

    Na zona anóxica, ocorre a transformação do nitrato a nitrogênio gasoso, pelas bactérias heterotróficas e a oxidação da matéria orgânica, utilizando o nitrato como receptor de elétrons.

    A zona anaeróbia, os índices de remoção de DBO são alcançados devido à alta capacidade de decomposição das bactérias anaeróbias.

  5. Sistema de Fluxo Vertical (SFV): O efluente a ser tratado é distribuído de forma intermitente sobre a superfície da camada suporte, inundando-a uniformemente. Após, o efluente é drenado gradualmente, atravessando todas as camadas do leito construído, no sentido vertical. A vazão deve ser controlada de modo a garantir que o efluente percorra todas as camadas antes de uma nova distribuição, permitindo que os espaços vazios sejam novamente preenchidos pelo ar.

    Este procedimento de inundação intermitente conduz a uma boa transferência de oxigênio. As bactérias responsáveis pela remoção de DBO e pela nitrificação estão presentes em todas as camadas do leito. Como nos SFH, as macrófitas também transferem oxigênio para a rizosfera, mas esta transferência é pequena, quando comparada à transferência obtida no sistema SFV.

Fatores de influência

Os principais fatores de influência em sistemas de tratamento tipo wetlands são:

A interação desses fatores é que determina a eficiência de remoção de poluentes específicos. A seguir serão comentados alguns detalhes importantes de cada um desses fatores de influência.

Um estudo hidrológico compreende a avaliação do fluxo interno de água superficial, precipitação, fluxo interno da água no solo, evapotranspiração, fluxo externo de água superficial e infiltrações. O hidroperíodo, além de influenciar as propriedades das macrófitas, é considerado também como fator selecionador de espécies, afetando diretamente a sua distribuição espacial e temporal.

O Regime Hidrológico é influenciado por

  1. Porosidade da camada suporte.
  2. Volume útil.
  3.  Superfície livre.
  4.  Formato dos tanques.
  5.  Duração de Inundações.
  6.  Evapotranspiração (clima).

A constituição da camada suporte é fundamental para a construção do sistema com macrófitas emergentes. O tipo e a textura das camadas afetam física, química e biologicamente os mecanismos de remoção dos constituintes do efluente. Em Sistema de Fluxo Sub-superficial (FSS), comumente são utilizados seixos, brita e areia como camada suporte.

As propriedades desejadas dos constituintes da camada suporte são:

  1. Permeabilidade: permitir o livre escoamento do efluente entre os materiais que compõem a camada suporte.
  2. Sustentação das plantas adultas: deve permitir a sustentação necessária para o desenvolvimento das plantas até a idade adulta.
  3. Favorecimento ao desenvolvimento das raízes: para que as raízes das plantas selecionadas possam atingir o grau de tratabilidade proposto pelo projeto.
  4. Neutralidade: cada material selecionado não deve influenciar, negativamente, nas características do efluente utilizado.
  5. Capacidade de filtração: a distribuição das camadas dos substratos está diretamente ligada à capacidade de remoção, principalmente, dos nutrientes do sistema.
  6. Facilidade de aquisição e manejo: a fácil aquisição dos materiais utilizados é decisiva para sua aplicabilidade no projeto. Os materiais utilizados devem ser de fácil manejo, não apresentando características nocivas aos operários, na construção e operação do sistema.

A vegetação, denominada de macrófitas emergentes, possui papel determinante na remoção dos constituintes do efluente. A sua principal característica é captar oxigênio da atmosfera, através de suas folhas e hastes, e o transportar para a zona de raízes.

Macrófitas aquáticas emergentes são plantas que projetam suas raízes no interior do solo e mantêm suas principais superfícies fotossintéticas projetadas acima do nível d’água, permanentemente ou na maior parte do tempo. Possuem um tecido de sustentação muito mais resistente do que as macrófitas flutuantes, por isso, possuem uma maior capacidade de remoção e retenção de nutrientes.

As macrófitas aquáticas emergentes mais utilizadas em sistemas de tratamento na Europa e Estados Unidos incluem os gêneros Typha, Phragmites e Scirpus. No Brasil, a preferência por juncos (Scirpus sp) e taboas (Typha sp), entretanto, existem muitas espécies de plantas com potencial para utilização nesses sistemas.

No RS, a riqueza de espécies é grande, mas poucas são aquelas que têm eficiência de remoção comprovada. A Figura 22 apresenta a relação de macrófitas de maior ocorrência na planície costeira do Estado.

FamÍlia

Nome CientÍfico

Nome vulgar

Alismataceae

Sagitaria lancifolia

Sagitária

Echinodorus grandiflorus

Chapéu de Couro

Cannaceae

Canna glauca

Caeté

Chenopodiaceal

Atriplex montevidensis

Atriplex

Cyperaceae

Scirpus californicus

Junco

Eleocharis Interstincta

Tiririca

Cypereus giganteus

Tiriricão

Conmbinaceae

Floscopa glabrata

Trapociraba

Euphorbiaceae

Sebastiania schottiana

Sarandi Vermelho

Phyllanthus sellowianus

Sarandi Branco

Typhaceae

Typha subulata

Taboa

Typha domingensis

Taboa

Typha latifolia

Taboa

Poaceae

Zizaniopsis bonariensis

Espadana
Palha

Fonte: Adaptado de Macrófitas Aquáticas da Planície Costeira do RS Irgang & Gastal, 1996

Mecanismo de remoção

Considerando as características das macrófitas emergentes e a profundidade da lagoa, poderão ser observadas 3 zonas distintas:

Nos sistemas que utilizam macrófitas emergentes podem ser observados vários mecanismos de remoção envolvidos, dependendo do tipo de contaminante a ser removido. A tabela a seguir apresenta, resumidamente, os mecanismos de remoção dos principais parâmetros de monitoramento.

ParÂmetro

Mecanismo de RemoÇÃo

Sólidos Suspensos Totais

Sedimentação/Filtração

DBO

Degradação microbiológica (anaeróbia e aeróbia)
Sedimentação

Nitrogênio

Nitrificação/Denitrificação
Volatilização da amônia
Absorção pelas raízes

Fósforo

Imobilização (reações de adsorção – precipitação com alumínio, ferro, cálcio, outros minerais do solo.
Absorção pelas raízes

Patogênicos

Sedimentação/Filtração
Radiação UV
Excreção de antibióticos pela planta e outras bactérias.

Fonte: WEF, 1994