Unidade A –Toxicodinâmica

Mecanismos

Interações de agentes tóxicos com receptores

Os receptores são elementos sensoriais no sistema de comunicações químicas que coordenam a função de todas as células no organismo. São constituídos por macromoléculas ou parte delas, situadas nas membranas celulares, no citoplasma ou no núcleo.

Interferências nas funções e membranas excitáveis

A manutenção e a estabilidade das membranas excitáveis são essenciais à fisiologia normal dos tecidos. As substâncias químicas podem alterar a função das membranas por vários meios. Por exemplo, o fluxo de íons através do axônio neural pode ser bloqueado pelas substâncias que agem como bloqueador do canal de íons. A tetrodotoxina, derivada de gônadas, fígado e pele de peixe da família Tetrodontidae, bloqueia os canais de sódio, situados nas membranas axônicas, impedindo trocas iônicas e liberação de acetilcolina.

Muitos solventes orgânicos produzem efeitos depressores no sistema nervoso central por alternarem a fluidez de membranas, em face de sua propriedade lipofílica, tornando-a mais densa e rígida e comprometendo vários processos que necessitam mudanças rápidas e reversíveis na estrutura da membrana. O álcool fluidifica as membranas, dissolvendo o componente lipídico e diminuindo a viscosidade. Com o tempo, a membrana celular torna-se mais rígida e menos sensível ao efeito fluidificante do álcool.

Inibição da fosforilação oxidativa

Existem muitas substâncias químicas capazes de desenvolver efeitos adversos, interferindo com a oxidação de carboidratos na síntese de adenosina trifosfato (ATP). Essa interferência pode ocorrer por bloqueio do fornecimento de oxigênio aos tecidos. A utilização de oxigênio pelos tecidos é bloqueada pelo cianeto, sulfeto e azida, por causa da sua afinidade ao citocromo oxidase.

A formação final de ATP, via oxidação de carboidratos, pode ser bloqueada também em outros locais. Por exemplo, a rotenona e a antimicina A interferem com enzimas específicas na cadeia transportadora de elétrons; os nitrofenóis desacoplam a fosforilação oxidativa e o fluoroacetato de sódio inibe o ciclo dos ácidos tricarboxílicos (ciclo de Krebs).

 

Animação sobre a estrutura da mitocôndria, disponível em http://objetoseducacionais2.mec.gov.br/handle/mec/2584.

 

Complexação com Biomoléculas

Componentes enzimáticos

Os inseticidas organofosforados como, por exemplo, N-metilcarbamato, cianeto e azatioprina, estão entre os agentes tóxicos que atuam inibindo as enzimas. Esses inseticidas inativam as enzimas colinesterases e, em consequência, reforçam, os efeitos da estimulação dos nervos colinérgicos pela acetilcolina endógena. Os grupamentos fosfato dos inseticidas fosforilam o sítio esterásico, da enzima, tornando a regeneração extremamente lenta, razão pela qual esta inibição é considerada irreversível. A função enzimática fica na dependência da síntese de novas enzimas e os efeitos tóxicos são decorrentes do acúmulo de acetilcolina nas terminações nervosas (a acetilcolina é desdobrada em metabólitos inativos de colina e ácido acético pelas colinesterases). Já o cianeto, atua sobre o sistema responsável pela respiração tecidual nas mitocôndrias. Sua ação ocorre na cadeia transportadora de elétrons, complexando o grupamento heme do citocromo oxidase ou citocromo a3, incapacitando-o de fixar o oxigênio. A morte celular é ocasionada pela inibição do aproveitamento de oxigênio.

O gás produzido em combustões incompletas, monóxido de carbono, se fixa à forma reduzida do ferro da hemoglobina, reduzindo o transporte de oxigênio aos tecidos, além de combinar-se com o citocromo oxidase.

Proteínas

Como já discutido na última aula, sobre Toxicocinética, os metabólitos resultantes das reações de fase I da biotransformação são, geralmente, intermediários eletrofílicos que interagem covalentemente com os sítios nucleofílicos das macromoléculas celulares, tais como proteínas, polipeptídios, RNA e DNA. Essas ligações podem dar início a processos tóxicos como mutagenicidade, carcinogenicidade e necrose, portanto, vale ressaltar que inibidores e indutores das enzimas de fase I podem contribuir para a toxicidade de xenobióticos.

As reações de fase II acontecem, majoritariamente, por inativação e conjugação dos metabólitos eletrofílicos com substratos endógenos para a excreção, a saturação das enzimas ou a depleção dos substratos endógenos que podem ocasionar a toxicidade.

Exemplos:

Lipídios

Alguns dos processos vistos anteriormente podem levar a danos celulares sem que ocorra a morte das células, outros, eventualmente, levam à morte celular até a perda de função do órgão. Tal fato ocorre, principalmente, quando a exposição ao toxicante se faz de forma crônica, onde os danos teciduais são cumulativos depois de repetidos episódios citotóxicos. Um dos principais mecanismos de morte celular é a peroxidação lipídica, que compreende uma série de reações químicas envolvendo a deterioração oxidativa dos ácidos graxos poliinsanturados, que pode romper as estruturas celulares e destruí-las.

Por exemplo, o metabólito intermediário do tetracloreto de carbono, tetraclorometil, induz a peroxidação lipídica e subsequente destruição dos componentes celulares.

Ácidos nucleicos

Existem numerosos sítios nucleofílicos na molécula do DNA, que podem prontamente reagir com agentes eletrofílicos, proveniente, muitas vezes, da reação de fase I da biotransformação. Por exemplo, a alquilação na posição O-6 da guanina na cadeia do DNA parece ser crítico para mutagenicidade e carcinogenicidade causadas por nitrosaminas.

A ligação do DNA a substâncias exógenas altera a expressão de produtos gênicos essenciais e necessários para a sobrevivência celular, podendo causar a morte ou desencadear uma complexa série de eventos, dando origem, por exemplo, ao câncer. No entanto, existem mecanismos de reparos intracelulares que podem reverter estas alterações. Se estas reversões forem eficazes, o dano ao DNA será eliminado e a célula sobreviverá sem sequelas. Mas algumas podem escapar do reparo ou são reparadas incorretamente, permitindo a inclusão do gene com mutação e a sua propagação.