Bioconcentração, bioacumulação e biomagnificação
As expressões bioacumulação e biomagnificação descrevem um processo pelo qual a concentração de poluentes nos animais aumenta conforme o aumento do nível trófico (na direção do topo da cadeia alimentar). A diferença entre esses termos é, portanto, muito sutil.
Esses termos são definidos de forma mais precisa em uma publicação recente sobre o assunto:
“Bioconcentração é o processo que causa o aumento da concentração de uma substância química em um organismo aquático, em relação a sua concentração na água, devido à incorporação, através de sua absorção, unicamente pela água, a qual pode ocorrer pela superfície respiratória e/ou pela pele”.
“Biomagnificação é a acumulação de uma substância na biota em toda a extensão da cadeia alimentar através da alimentação”.
“Bioacumulação é o somatório desses dois processos”.
Para que esses processos ocorram, a substância deve ser lipossolúvel, ou seja, possuir a propriedade de se dissolver preferencialmente em gorduras, podendo assim fixar-se nos tecidos dos seres vivos e ali permanecer quando persistentes.
A lipossolubilidade é também função do alto grau de cloração dessas moléculas que as faz capazes de atravessar com facilidade a estrutura fosfolipídica das membranas biológicas e de se acumularem no tecido adiposo.
A propriedade físico-química que mede o grau de solubilidade em gorduras é o coeficiente de partição octanol/água (Kow ) que por ter valores muito dispersos é normalmente expresso na forma logarítmica. Recentemente15 esta propriedade foi utilizada para fazer correlações preditivas da bioacumulação de poluentes orgânicos. A importância deste trabalho reside no fato de que a bioconcentração pode ser investigada em laboratório, mas o mesmo não acontece com a bioacumulação, uma vez que ela não inclui o efeito de biomagnificação.
O fato de esses compostos também terem uma solubilidade relativa na água é que os tornam disponíveis para a bioacumulação nos seres vivos. Caso eles fossem insolúveis em água, eles se depositariam no solo e sedimentos e não podendo se dissolver na água se tornariam indisponíveis para o consumo.
As classes de compostos com maior capacidade de bioacumulação são compostos cíclicos, aromáticos e clorados com moléculas grandes, ou seja, pesos moleculares maiores do que 236g/mol. Exemplos de compostos pertencentes a esta classe são o DDT, clordano, lindano, heptacloro, aldrin, dieldrin toxafeno, mirex e clordecona.
Recentemente, foi feito um estudo no México examinando os níveis de DDT diretamente no tecido adiposo de mulheres residentes em regiões de baixa e alta exposição ao DDT. Os níveis de DDT no tecido adiposo das mulheres participantes do estudo foram consistentes com os registros dos volumes de DDT pulverizados no México. Devido a seu caráter lipofílico o DDE, metabólito do DDT, tem sido encontrado no leite materno de populações mexicanas onde a malária é endêmica, em concentrações maiores do que as permitidas pela OMS. O estudo confirmou a amamentação como um mecanismo de eliminação desse inseticida, através da correlação entre o tempo de amamentação e a quantidade de DDT remanescente no tecido adiposo. O consumo de peixe e presunto também está fortemente relacionado com os níveis de DDE no tecido adiposo das mulheres mexicanas, porém DDT também foi encontrado em vegetais, alimentos que não contêm lipídios e os autores sugerem a realização de pesquisas para estabelecer os mecanismos que poderiam ser responsáveis pela incorporação de DDT em vegetais.
A lipossolubilidade desses compostos, aliada a sua estabilidade química, faz com que se concentrem indefinidamente ao longo da cadeia alimentar. Um exemplo muito ilustrativo dessa propriedade pode ser encontrado numa revisão do livro “Our Stolen Future” recentemente publicada: é descrita a viagem hipotética de uma molécula de PCB do seu ponto de fabricação no Alabama, EUA, até o Atlântico Norte, onde sua concentração no tecido gorduroso de um urso polar acaba sendo, segundo o autor, magnificada por um fator de 3 bilhões.