Unidade D - Toxicologia dos Alimentos

Metais em alimentos

Todas as formas de vida são afetadas pela presença de metais, alguns desses elementos são benéficos, enquanto outros são danosos aos sistemas biológicos, dependendo da dose e da forma química.

O homem, estando no ápice da cadeia alimentar, consome alimentos provenientes do meio ambiente e a presença de metais, muitas vezes, está associada à localização geográfica ou diretamente aos níveis de metais existentes na água e no solo. A presença desses metais pode ser controlada, quer limitando o uso de determinados produtos agrícolas que contenham metais, quer impedindo o uso de água contaminada ou, então, proibindo a produção de alimentos em águas e solos contaminados.

Chumbo

Os romanos utilizavam o chumbo na área de engenharia, fabricando tubulações para o transporte de água. Era prática frequente o uso de utensílios domésticos, como jarras e copos, confeccionados com chumbo. Dessa maneira, nas áreas em que a água era de caráter ácido, havia maiores riscos de exposição ao metal. Portanto, os alimentos e a água eram importantes fontes de exposição.

Atualmente, o nível de contaminação dos alimentos produzidos próximos a regiões industrializadas é afetado pelas características das indústrias existentes. À medida que se afasta das fontes de contaminação, as concentrações de chumbo encontradas nos alimentos diminuem.

A maior parte do chumbo presente no trato gastrintestinal é resultante da ingestão de alimentos e bebidas. Apesar de a solubilidade dos sais e complexos de chumbo ser um dos fatores importantes no processo de absorção deste metal, ela é influenciada sobremaneira pelas condições de plenitude estomacal e pela presença de proteínas, Ca, Fe e P.

Abaixo, temos uma figura com representação dos níveis de menor efeito observado (LOEL) para adultos.

LOEL Pb (μg/dL) efeitos
Hematológico Neurológico Renal TGI Reprodutivo Cardiovascular
100-120 Encefalopatia (sinais e sintomas)     Sintomas evidentes    
80 Anemia          
60         Ovário (efeitos)  
50 Redução na síntese de Hb Sub-encefalopatia (sintomas)        
40 Níveis elevados de Copro-U e ALA-U   Nefropatia crônica   Função testicular alterada  
30   Nervos periféricos        
25-30 PPIX elevada (homens)         PS elevada
15-20 PPIX elevada (mulheres)          
10 Inibição ALA-D          

Fonte: OGA, Seizi. 1996

COPRO-U: Coproporfirina na urina
ALA-U: Ácido delta-aminolevulínico na urina
Hb: Hemoglobina
PS: Pressão sanguínea
ALA-D: Ácido delta-aminolevulínico desidratase
PPIX: Protoporfirina IX

Cádmio

A primeira descrição dos efeitos tóxicos produzidos pelo cádmio no homem deve-se a Sovet, em 1858. Somente nas últimas décadas tivemos um significativo aumento no número de estudos científicos sobre o metal. Contrastando com o chumbo e mercúrio, até 1950 havia poucas informações sobre o aspecto toxicológico desse elemento, foram os avanços tecnológicos que colocaram à disposição dos pesquisadores equipamentos que puderam avaliá-lo com maior precisão e exatidão.

No Japão, em 1950, como consequência da ingestão de alimentos contaminados pelo cádmio, ocorreu intoxicação caracterizada por osteomalácia e proteinúria. O cádmio tornou-se um dos metais mais pesquisados, e as observações mostraram ser ele um elemento de lenta excreção, meia-vida biológica longa (décadas) nos músculos, rins, fígado e em todo o organismo humano.

A produção do aço é responsável por uma parte considerável da emissão, entretanto, a incineração do lixo representa a maior fonte de liberação de cádmio na atmosfera de vários países.

A doença de Itai-itai é uma doença óssea endêmica, prevalente na bacia do rio Jinzu, na região centro-oeste do Japão. Até 1996 ocorreram mais de 100 mortes com elevada incidência, principalmente no período de 1936 a 1950. Em março de 1989, 150 casos da doença de Itai-itai foram oficialmente reconhecidos como associada à poluição. A enfermidade se caracteriza por uma síndrome associada ao sistema ósseo e metabolismo do cálcio, ocasionando ao paciente uma elevada incidência de fraturas, acompanhadas por dores severas e disfunção túbulo-renal.

Casos de intoxicações agudas acorreram em 1940 e 1950, devido à ingestão de alimentos contaminados pelo cádmio, os sintomas característicos eram náuseas, vômitos e fortes dores abdominais.

Nas exposições em longo prazo, através da ingestão de alimentos contaminados pelo cádmio, observam-se alterações renais com disfunção renal tubular, proteinúria, glicosúria e aminoacidúria.

Mercúrio

A progressiva utilização do mercúrio, para fins industriais e o emprego de compostos mercuriais durante décadas na agricultura, resultou no aumento significativo da contaminação ambiental, especialmente da água e dos alimentos.

A biotransformação do mercúrio inorgânico a metilmercúrio, por bactérias, é o processo responsável pelos elevados níveis do metal no ambiente. O metilmercúrio acumula-se em cada passo da cadeia alimentar, chegando a alcançar elevados níveis nos peixes.

Episódios com características epidêmicas foram documentados no Japão, onde o metilmercúrio bioacumulado no ecossistema foi o agente causador de centenas de intoxicações.

O rim é o órgão crítico após a ingestão de sais bivalentes de mercúrio. Em casos de intoxicações agudas observam-se lesões gastrintestinais, compreendendo desde gastrite moderada até ulceração da mucosa com necrose do tecido e lesões renais que conduzem à falência renal.

As funções mais afetadas nos adultos são as relacionadas à coordenação, à visão e à audição. Os efeitos iniciais não são específicos, destacando-se mal-estar, visão obscurecida e parestesia. Posteriormente, detecta-se constrição do campo visual, disartria, surdez e ataxia. Nos casos menos graves, é possível certo grau de recuperação funcional por um mecanismo compensatório do sistema nervoso central.

O sistema nervoso periférico é afetado por doses elevadas de metilmercúrio. Os sintomas de debilidade muscular são revertidos pela administração de inibidores da acetilcolinesterase.